A escola é um ambiente encorajador para que a criança ou adolescente relate a violência sexual sofrida, às vezes dentro de casa. A reflexão foi feita nesta quarta-feira (8) pelo promotor de Justiça Leandro Turmina, coordenador-adjunto do Centro de Apoio Operacional (CAO) da Infância e Juventude, durante entrevista à Rádio CBN 95,9 FM, como parte da programação da Campanha Estadual de Enfrentamento e Combate ao Abuso e à Exploração Sexual Infantojuvenil do Ministério Público do Estado de Mato Grosso. Durante a entrevista, ele lembrou que no Brasil a cada hora três crianças são vítimas de violência dessa natureza, o que custa caro à sociedade, uma vez que rouba sonhos e sequestra a infância e a adolescência de muitos jovens. Confira e entrevista na íntegra aqui.
“Quem comete esse tipo de crime não tem um estereótipo definido: pode ser uma pessoa de terno e gravata, como pode ser o vizinho que chama a criança para um sorvete, ou então o pai ou padrasto. Também pode ser a mãe ou a madrasta, o irmão mais velho, um tio, um amigo da família. Não tem como olhar para uma pessoa e dizer que ela é capaz de cometer algum abuso. Aonde você menos espera, seja um lar abastado ou não, isso pode acontecer. Tudo isso pra dizer que o problema pode estar mais perto do que você imagina. Por isso, a campanha é importante por colocar o tema na pauta não só neste mês de maio, mas em nosso dia a dia”, avaliou o promotor de Justiça.
Na entrevista comandada pelos jornalistas Camila Ribeiro e Pedro Panok, foram abordados aspectos da atuação nas esferas civil e criminal do Ministério Público do Estado de Mato Grosso na proteção das vítimas e na responsabilização dos agressores. No âmbito criminal, o promotor de Justiça lembrou de uma dinâmica usada no passado na coleta de provas que favorecia a revitimização da criança ou adolescente.
“O que acontecia? Esta criança contava para uma pessoa de confiança, depois contava para o conselheiro tutelar, contava para o escrivão que colhia o termo e quando o processo iniciava tinha que contar para o juiz. Essa pessoa era revitimizada. Desde 2018, realiza-se o depoimento especial, uma única vez, como prova antecipada, de modo a evitar que a vítima tenha que reviver na memória e na sua dor todo aquele sofrimento. Hoje, ela não é revitimizada. É garantido que a vítima não tenha qualquer contato, ainda que visual, com o suposto autor/acusado ou mesmo de alguém que represente ameaça para ela”, relatou o representante do Ministério Público.
O promotor de Justiça destacou que no MPMT há dois projetos importantes, reconhecidos nacionalmente. O “Prevenção Começa na Escola”, que usa um espetáculo teatral para levar informações e esclarecimentos sobre bullying, violência sexual, gravidez na adolescência e uso de drogas. “O espetáculo percorre escolas de todo o estado. É muito comum, após a encenação, alunos se identificarem como vítimas e contar o caso a professores e coordenadores, que por sua vez levam ao conhecimento das autoridades”, narra Leandro Turmina.
Outra iniciativa é o Projeto Luz, implantado em Nova Mutum (município distante a 241 km de Cuiabá), que padronizou o atendimento da rede às vítimas e apuração dos casos, resultando em ocorrências registradas em boletins policiais que pudessem ser efetivamente investigados para uma maior resolutividade. Agora o projeto possui um aplicativo que contribui para que a rede possa acompanhar cada caso.
Leandro Turmina também citou dados mais recentes do Ministério da Saúde, que apontam que 202.948 casos de violência sexual contra crianças e adolescentes foram notificados no Brasil no período de 2015 a 2021. O que dá uma média de 80 casos por dia nesses sete anos. Citou que maio é um mês emblemático na luta pela proteção de crianças e adolescentes contra o abuso e a exploração sexual por causa de duas datas: 3 de maio (Dia Nacional de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra Crianças e Adolescentes), e 18 de maio (Dia Nacional do Enfrentamento ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes).
Henry Borel e Araceli Cabrera – Datas que marcam lutas e bandeiras e que resgatam memórias na defesa de crianças e adolescentes viveram tragédias pessoais, mas que representaram o ponto de partida para mudanças na lei por Justiça. É o caso da menina Araceli Cabrera Sánchesz Crespo (02/07/1964 – 18/05/1973), morta aos 8 anos de idade, depois de ter sido raptada, drogada, estuprada e morta em Vitória (ES). A tragédia motivou a Lei 9.970/00, que transformou a data da morte dela em símbolo de luta ao nascer o Dia Nacional do Enfrentamento ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes.
O garotinho Henry Borel (03/05/2016 – 08/03/2021) foi assassinado aos 4 anos no apartamento onde morava com a mãe professora e o padrasto, que era médico e vereador. Ambos são acusados de violência contra o garoto, que sofreu 23 lesões “por ação violenta”. Ele deu entrada no hospital com mãos e pés gelados e dificuldade para respirar. Inicialmente o caso foi tratado como acidente, mas depois de depoimentos, apreensões e reconstituições, mãe e padrasto viraram suspeitos.
A data de nascimento do menino resultou na Lei nº 14.344/2022, que criou o Dia Nacional de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra Crianças e Adolescentes e passou a ser conhecida como “Lei Henry Borel”. A referida lei estabeleceu, entre outras coisas, medidas protetivas específicas para as vítimas de violência e considera crime hediondo o assassinato de menores de 14 anos. “Se houver risco iminente à vida ou à integridade da vítima, o agressor deverá ser afastado imediatamente do lar ou local de convivência. Em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a prisão preventiva do agressor, mas o juiz poderá revogá-la se verificar falta de motivo para a manutenção”, estabelece uma das medidas protetivas.
Campanha – O carro-chefe da campanha estadual é um vídeo institucional de 30 segundos viabilizado com o apoio de parceiros privados e instituições públicas, exibido na TVCA. A ação também inclui peças virtuais para redes digitais/sociais, busdoor, outdoor e entrevistas no estúdio na Rádio CBN Cuiabá (95,9 FM), todas as quartas-feiras, no horário das 9 às 10h. Serão ao todo quatro entrevistas, uma por semana, com autoridades que integram a rede de atendimento. Cada programa traz um enfoque diferente dentro da temática de enfrentamento e combate ao abuso e à exploração infantojuvenil.
A campanha tem apoio da TV Centro América, Bom Futuro, CBN Cuiabá, Áster Máquinas (John Deere), Associação Mato-grossense dos Produtores de Algodão (Ampa), Energisa, Plaenge, Associação Mato-grossense do Ministério Público (AMMP), Amaggi, Ginco Urbanismo e SpeedLabel.
Serviço – A Ouvidoria-Geral do Ministério Público do Estado de Mato Grosso é o canal de comunicação da instituição com a população. Por ela, é possível fazer qualquer tipo de denúncia. As manifestações (denúncia, crítica, elogio, sugestões, reclamações ou pedidos de informação) podem ser feitas pelo telefone 127 (custo de uma ligação local), pelo WhatsApp nos números (65) 99271-0792 | 99255-4681, aplicativo MP Online (disponível para os sistemas operacionais Android e iOS), e-mail: ouvidoria@mpmt.mp.br ou formulário eletrônico de manifestação.
Fonte: MP/MT