“Sou uma travesti. Gosto e reivindico esse lugar, porque, para além do gênero, é também um termo político. Porque é um lugar que há muito tempo foi ligado ao crime, ao ódio, então a gente ressignifica para usar como um nome de fortalecimento”, afirma a artista e publicitária Geovana Rodrigues, 31, em conversa com o GD.
Cuiabana formada em teatro, Geo Rodrigues, como é conhecida, viu na arte a oportunidade de mostrar ao mundo sua vivência enquanto pessoa LGBTQIA+. Foi durante a pandemia de covid-19 que ela decidiu tornar público seu processo de transição.
Ao GD, Geo conta que ao longo dos anos passou a se entender como realmente é: uma travesti. E que esse entendimento veio de dentro para fora, de modo íntimo e tranquilo. Contudo, ela afirma que sua experiência pessoal não diminui a gravidade dos problemas sociais, como a violência, enfrentada pela população LGBTQIA+ (lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, queer, intersexuais, assexuais), em especial travestis e mulheres transexuais, que representam 61,74% dos casos de mortes violentas contra LGBTI+ registrados no país em 2023, segundo dados do Observatório de Mortes e Violências LGBTI+ no Brasil. Em números totais, somam 142 mortes.
“Quando a gente é criança, qual imagem que a gente tem de travestis, senão aquelas de pessoas extremamente violentas, que aparecem na noite, quase como um conto da cuca, cuidado que a travesti vai te pegar”, lamenta a artista, que, cansada de se ver representada pela ótica do sofrimento, roteirizou o que seria um curta-metragem experimental, que leva o nome de D’Água.
A produção audiovisual lançada em 2022 retrata a vivência em torno da transição de Geo Rodrigues, traçando um paralelo entre o curso das águas e a travestilidade.
Para que o curta saísse do papel, Geo buscou a ajuda de um coletivo cuiabano formado majoritariamente por pessoas LGBTQIAP+, a Adjodja Filmes. O grupo independente de produção audiovisual faz referência ao termo “adjojar”, que seria o mesmo que “juntar” no linguajar cuiabano, trazendo a ideia de colaboração e diversidade. É o que narra Isabelle Fanaia, realizadora audiovisual e membro do coletivo.
Nascida da vontade de colocar em prática as técnicas adquiridas ao longo do curso de Radialismo e Cinema e Audiovisual da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), aliada à necessidade de representar vivências pouco mostradas nas telonas, o grupo surgiu no final de 2021.
Atualmente com 7 integrantes que se identificam como LGBTQIAP+, suas produções rodam o Brasil em festivais de cinema, inclusive o curta experimental D’Água é premiado como melhor filme pelo voto popular na mostra transpower, do festival FestMina, realizado em Goiânia.
Com obras que abordam identidade de gênero, sexualidade, raça e demais questões sociais, Fanaia vê o audiovisual como um aliado. “Além de uma ferramenta de experimento, também é um grande instrumento de transformação social, de levantamento de pautas, de questões sociais e é uma importante ferramenta de transmissão de informações também. Para a gente que cria essas obras, elas refletem nossas identidades e conversam com essas questões”, diz Isabelle.
Assim como Geo Rodrigues, Fanaia é uma das muitas pessoas LGBTQIA+ que se utilizam da arte como forma de expressão e resistência em Mato Grosso, estado em que denúncias de violência aumentaram 366% de janeiro a maio de 2023, conforme noticiado pelo Jornal A Gazeta.
Em 17 de maio de 1990, a Organização Mundial da Saúde (OMS) retirava a homossexualidade da Classificação Internacional de Doenças (CID). A data ficou marcada como Dia Internacional contra a LGBTfobia e registra a luta por visibilidade e garantia de direitos sociais para a população LGBTQIA+.
Fonte Gazeta Digital