Em meio a um recorde nacional histórico de pessoas LGBTQIA+ disputando as eleições, Mato Grosso fica para trás e ainda é um dos estados com menor adesão de candidatos da comunidade nos pleitos eleitorais.
No Brasil, segundo dados do site VoteLGBT+, foram 214 candidaturas LGBTQIA+ registradas pelos partidos na Justiça Eleitoral para a disputa de outubro deste ano. O número tem 57 pessoas a mais do que em 2018, porém ainda representa menos de 1% do total de registros.
Já em Mato Grosso, os dados mostram que até o momento apenas quatro mato-grossenses ocupam a lista de candidatos que pertencem e lutam pelas pautas LGBT.
São eles: Julian Tacamã (PSOL), candidato a deputado federal; Thiaguinho (PSB), também candidato à Câmara Federal; Professora Graciele (PT), candidata a estadual e Valkiria Brandão (Cidadania), disputando vaga na Assembleia.
Clóvis Arantes, integrante da ONG Livremente, que visa articular ações de construção e efetivação de políticas públicas destinadas à população LGBTQIA+, afirmou que essa baixa adesão é consequência do conservadorismo do Estado.
“Aqui parece que voltamos para trás, para variar. Tinham vários pré-candidatos assumidamente LGBTs que não passaram na convenção”, afirmou em entrevista ao MidiaNews.
“Eles [os partidos] entendem que a nossa pauta tira votos, porque tem aquela falácia de que não é família, que LGBT querem acabar com a moral e é justamente o contrário”, acrescentou.
Ao analisar o cenário regional, Clóvis enfatiza a luta da comunidade para garantir políticas públicas à população LGBT. No entanto, explicou que é complicado avançar nessas reinvindicações com a falta de representatividade dentro da Assembleia e da Câmara Federal.
Com a LGBTfobia internalizada dentro dos partidos, nem mesmo investimento nas campanhas os candidatos recebem. Por isso, Clóvis disse ser favorável ao fundo eleitoral público que, para ele, seria uma forma de garantir o mínimo de incentivo às campanhas.
Eles [os partidos] entendem que a nossa pauta tira votos, porque tem aquela falácia de que não é família, que LGBT+ querem acabar com a moral e é justamente o contrário
“Não dá para continuar concorrendo com alguém do agronegócio, que a gente sabe que não é a mesma relação de investimento. Precisamos cobrar isso, que realmente os investimentos das campanhas se deem de forma pública e ai todo mundo tem a mesma possibilidade”, explicou.
Representatividade nas urnas
Aos 25 anos, Julian Tacanã é o primeiro candidato a deputado federal transmasculino em Mato Grosso. Ele contou que começou na política ao se filiar ao PSOL, mas decidiu tentar sua primeira vaga na política apenas esse ano.
A escolha de tentar uma vaga na Câmara Federal vem do desejo de poder mudar a legislação brasileira em relação aos direitos tanto dos LGBTs quanto da população mais pobre do País.
Vindo de um ambiente periférico, ele vivencia os dois lados da moeda e acredita que pode fazer a diferença.
“É no Congresso que se aprova as leis e enquanto uma pessoa LGBT, enquanto um homem trans, a maioria dos direitos que temos hoje garantidos não foi feita a partir de projeto de lei. Foi feita a partir do judiciário. Daí vemos o quanto é necessário a gente ocupar esses espaços, visto que a minha população é a que mais sangra nesse país”, disse.
Sendo Mato Grosso o terceiro Estado que mais mata pessoas LGBTs, Julian relatou que foi difícil decidir enfrentar uma eleição sem investimento, estrutura e em um ambiente hostil de transfobia.
No entanto, se inspirou em nomes fora do Estado para que pudesse tomar coragem de fazer a diferença e história em Mato Grosso. Além de representatividade, ele também almeja mostrar que o espaço político pertence aos LGBTs.
“Hoje, essa construção tem meu nome, mas é uma construção feita por várias mãos de um ideal coletivo, de conseguir defender aqueles e aquelas que foram esquecidos”, afirmou.
Busca pela igualdade
Também almejando um espaço na política, Valkiria Brandão lançou sua candidatura à deputada estadual. Assim como Julian, ela almeja conseguir ser a primeira mulher transexual a conseguir uma vaga na Assembleia.
“Esse ano a classe LGBT foi muito atacada e acredito que para entrar no meio político é difícil, precisa de uma pessoa corajosa e essa coragem eu tenho”, disse.
Hoje essa construção tem meu nome, mas é uma construção feita por várias mãos de um ideal coletivo, de conseguir defender aqueles e aquelas que foram esquecidos
Engajada em causas sociais, principalmente com crianças que possuem espectro autismo, ela quer trabalhar não só pelo direito dos LGBTs, mas também engajar as ações que já desenvolvia em São José do Rio Claro, interior de Mato Grosso.
Tendo passado por várias profissões, ela contou que o único meio em que sofreu preconceito foi na política, mas se mostra otimista de poder mostrar seu nome e suas propostas, mesmo sem garantia de vitória.
Mesmo em um cenário desfavorável. Para Clóvis, toda candidatura em Mato Grosso precisa ser comemorada.
Apesar de não haver uma solução concreta para o conservadorismo mato-grossense, ele acredita que é preciso educar politicamente todos da comunidade para que tenham consciência da importância de uma eleição e, assim, fazer a diferença nas urnas.
“Sou muito otimista, acho que temos tudo para virar esse jogo em favor dos direitos humanos”, finalizou.
Para conhecer os candidatos LGBTQIA+ que disputam a eleição em Mato Grosso, acesse o site VoteLGBT+.
Fonte: www.midianews.com.br